terça-feira, 17 de outubro de 2006

Uma metáfora

Ontem estava indo dar uma aula e, num semáforo movimentado de Brasília, havia um pessoal agitando bandeiras do PT e distribuindo adesivos broches bonés sei lá mais o que do PT e do Lula. Estavam animados, sorriam e distribuíam os adesivos como se fossem promessas de um futuro melhor. Eu, como vou votar no Lula sem nenhuma empolgação, como já disse aqui, não peguei nada. Mas um carro branco que estava na minha frente (cuja placa não era de Brasília, aliás, e sim do Mato Grosso — não que isso tenha qualquer importância no que vou contar) pegou um monte. Era a família toda. Pai mãe filho filha tia cachorro. Todos pegaram adesivos e decalques e panfletos. Achei bonito, para falar a verdade. Em todas as eleições anteriores, desde que me dou por gente, agitei bandeira e enchi o peito de adesivos do PT. Senti uma certa nostalgia. Pensei, inevitavelmente, "o que foi que deu errado?".
Nisso o sinal abriu. Percorridos poucos metros, o pessoal do carro branco da frente, após colar os adesivos no peito, jogou os papéis que sobraram pela janela. Tive vontade de buzinar. Se tem uma coisa que me dá raiva na vida é ver gente jogar lixo na rua. Mais do que quem fura fila ou bate uma carteira. Já comprei briga na rua por causa disso. Uma vez estava num ponto de ônibus e um sujeito duas vezes maior que eu terminou de tomar seu refrigerante e jogou a lata no chão. Eu, vermelho, dei duas cutucadas nas costas dele e, quando o mala se virou, esbravejei "Tem uma lata de lixo bem ali, porra!". Ele ficou meio atordoado e, quando esboçou um movimento (não sei se para apanhar a lata no chão ou para voar em cima de mim), entrei no primeiro ônibus que abriu a porta. Ok, sou um covarde. Mas falei o que devia falar ao sujeito.
Mas voltando ao episódio de ontem. Pensei em buzinar e chamar de porco. Mas então percebi que o que tinha acabado de acontecer era uma metáfora. Não uma metáfora dos petistas. Nem dos mato-grossenses. Já vi todo o tipo de gente jogar lixo no chão. Amigos meus, bem-educados, de boas famílias, jogam lixo na rua. Já me apaixonei por meninas que jogavam lixo na rua. As ruas vivem cheias de lixo, o que comprova que quase todo mundo joga lixo na rua. Impunemente. Há poucos dias vi uma mulher, numa camionete de luxo, jogando uma bola de papel, não só na rua, mas tentando acertar o motorista de outro carro, provavelmente por alguma fechada anterior. No vidro de trás da camionete havia um decalque do PSDB.
Aquela cena de ontem, então, era uma metáfora do brasileiro. O brasileiro é um povo que vota no Lula (ou no Alckmin ou em qualquer um deles) depois joga lixo na rua. Reclama de corrupção no governo e joga lixo na rua. Enche o peito de adesivos, com esperança de dias melhores, depois joga lixo na rua.
Aí, meus caros, não adianta nada. Diz o ditado que cada povo tem o governo que merece. Um povo que joga lixo na rua merece políticos sujos.



Bom, por falar em sujeira, leiam este ótimo texto do Mauro Santayana no JB.

Um comentário:

Anônimo disse...

Texto bem amarrado, Luís. Ficou bacana mesmo.